domingo, 6 de janeiro de 2019

Amizades desfeitas e a Democracia representativa II

Nesta semana um idiota voltou a me provocar no WhatsApp, mandando-me uma imagem na qual se viam alguns rapazes sorridentes ao redor de uma mesa de sinuca. Na tosca montagem, os tacos do jogo haviam sido substituídos por espingardas e fuzis, e sua legenda dizia "EU E MEUS AMIGOS QUANDO BOLSONARO FOR ELEITO EM 2018".

Antes de bloqueá-lo, depois dessa sua terceira provocação, devolvi a mensagem. Enviei-lhe a foto de um rapaz morto de forma violenta, com dentes quebrados, hematomas no rosto inchado e sangramento na boca e no nariz e fiz questão de legendá-la com a mensagem "EU E MEUS AMIGOS SE BOLSONARO FOR ELEITO EM 2018 POR GENTE COMO VOCÊ E SEUS AMIGOS".

Tempos atrás, tive uma ligeira indisposição com um amigo querido porque eu disse que alinhamento político diverso ao meu era um fator limitante para determinar meu interesse ou não por uma pessoa, ao que fui interpelado com o argumento de que opiniões divergentes são fundamentais para o crescimento e que não se deve perder a chance de descobrir pessoas interessantes por causa de política, já que os candidatos "estão lá" e "nossa vida segue por aqui", como se nossa existência fosse indiferente às políticas do nosso país.

Incomodo-me demais com esta visão de que política é uma coisa alheia à nossa vida, como se fosse um universo paralelo incapaz de nos afetar.

É claro que opiniões divergentes geram debates e enriquecem as ideias. Concordo em absoluto com esta premissa, o que não significa que eu deva ser aberto a toda e qualquer opinião. Especialmente se a manifestação dessa opinião for contrária a valores que trago como essenciais.

Disse-lhe que eu jamais conseguiria me envolver afetivamente com alguém que votasse num candidato como o Bolsonaro e fui tachado de radical por este posicionamento. "Uma pessoa pode ter outras qualidades". Sim, pode! Mas, conferir um voto a um candidato totalmente desalinhado com os valores que tomo como diretrizes para a minha própria existência faz dessa pessoa alguém diametralmente oposto a mim, anulando qualquer outro valor que porventura esta pessoa venha a ter.

Política é algo muito mais perto de nós do que imaginamos. E podemos extrair isto do artigo 1º, Parágrafo único, da Constituição Federal, que diz: "Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente". Significa que vivemos em uma democracia representativa, ou seja, que conferimos ao nosso candidato o poder que nos cabe, para que ele tome, em nosso nome, as medidas que nós mesmos tomaríamos. Por isso, são chamados de representantes eleitos. Porque eles representam aquilo que somos.

Assim, se alguém confere a um candidato como Jair Bolsonaro o poder para que ele venha restringir direitos das minorias, fazendo-as se curvar à maioria, como já declarou inúmeras vezes, este eleitor está dizendo que concorda com esta política e se sente representado por quem a exerce. Se alguém confere a este candidato o poder para agredir homossexuais, mulheres, negros, índios, não cristãos, está dizendo a mim que faria isto tudo se lhe coubesse. Como não cabe, outorga a um representante seu que o faça em seu lugar.

Uma pessoa que faz tudo isso está dizendo a mim que a minha existência é um erro e valida qualquer tentativa de corrigi-lo, ainda que eu venha a ser massacrado na rua com a chancela do seu candidato. Uma pessoa desta definitivamente não é digna da minha consideração, da minha amizade, do meu afeto, tampouco de qualquer laço existente meramente por consanguinidade.

O imbecil que me provocou reiteradas vezes pelo meu WhatsApp ao longo dos últimos dias já foi devidamente freado do meu convívio com um bloqueio no meu aplicativo. Se ele quiser jogar a sinuca dele com seus amigos, usando armas de fogo em lugar de tacos, que fique à vontade. Mas, quando um dos seus disparos me atingir, que não lamente pela escolha que fez. Ele escolheu me alçar à qualidade de alguém que pode deixar de existir.

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