sábado, 12 de setembro de 2020

Dádiva

Dádiva

Plantou o Criador no chão do Paraíso
do fruto proibido árvore frondosa.
E, cruel, jogou seus dados, fez apostas.
Criava num instante a Curiosidade.

Desafiou mulher e homem, criou a Tentação
(e tolo que tu és, acreditaste
que fora a serpente que o fizera!):

“Daquela árvore não deveis comer jamais!”
– Disse o Criador à Criatura –
“Posto que o fruto que dali se colhe
faz brotar em vossas mãos arma mortal.”
– Prossegue, odioso, ameaçando –
“Viveis no Paraíso, olhai em derredor,
haveis de não quererdes outro mundo.
Obediência cega vos exijo.
Não comais do fruto que ali medra.
O nome, não olvideis, Conhecimento.”

Quando homem e mulher a sós se viram,
conspiraram: “Prova tu da fruta o caldo.”
E de Conhecimento, lambuzados,
fartaram-se até que se olharam.
Quando, então, envergonhados, nus se viram,
do Éden foram ambos exilados.

Armados agora estavam. Era tarde...
De Conhecimento as dores padeciam
Amargando a expulsão do Paraíso.
Outrora cegos, doravante enxergavam!

“Conhecemos agora o mundo que nos ronda”
– Dizia um à outra (ou seria o inverso?) –
“Aqui tudo nos parece lacrimoso.
Onde andamos antes, que não vimos,
quão dorida pede ser a existência?”

Ao que respondeu a outra desgraçada:
“Tivemos as mãos livres, mas teimamos
Em querermos o saber. Erro irreversível!
Ai de nós, que, infelizes, conhecemos...
...conhecemos! ...o que noutros tempos idos
nos era desconhecido. Agora cá estamos,
amaldiçoados, expulsos, degredados.
Esbulhados em nosso bem mais precioso:
vida cega de quem está na Ignorância,
a que um dia chamamos Paraíso.”

Gustavo Carneiro de Oliveira
Rio, 13.09.2020.