sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Aconteceu em Lumiar

(Originalmente publicado como postagem no meu perfil do Facebook, exatamente um ano atrás).

A noite ia caminhando, lenta, mole, calma. Os lampiões das ruas lançavam sombras de padrões diversos sobre o chão de paralelepípedos, tão característico destas paragens interioranas. Uma brisa fria tomava forma e se arrastava sorrateira pelas curvas do vilarejo, fazendo com que as pessoas saíssem dos bancos nas praças e retornassem ao conforto de seus lares.

Um pouco adiante, um homem e um cão dialogavam entre si, nos modos que apenas um homem e um cão conseguem fazer. Ambos pareciam felizes.

Ao cruzarmos pelos dois, vimos o cachorro saltitando em nossa direção. O homem, que até então estava agachado, levantou-se.

- É de vocês este cachorro?
- Não. Havia um senhor brincando com ele ainda há pouco ali atrás. Acho que é dele.
- Ah! Se fosse da rua, eu o levaria para minha casa agora.
- Não vemos mais o senhor que estava com ele. Vai ver que o cachorro é de rua mesmo.

O homem voltou a fazer carinho no animal, que o retribuiu sacudindo a cauda. Dei força:

- Leve-o com você. Está frio. Se o dono aparecer você devolve. Já que o senhor o quer e parecem se dar tão bem...

Ele se agachou para pegar o cachorro no colo. Assustado, o animal gritou e recuou. O homem tentou mais uma vez e novamente o cachorro se afastou.

- Ele pode ser de rua e estar pouco habituado a ser pego no colo. Cuidado para que ele não o morda. Melhor que o senhor vá caminhando e chamando para que ele o siga. Ele está te seguindo mesmo!

Assim, o homem foi subindo a ladeira de calçados irregulares. Passou por postes com lampiões e alternou entre as luzes acesas e as sombras projetadas. Atrás dele, seguiu o cãozinho.

Nós os acompanhamos com o olhar até vê-los subirem a rua e se perderem numa curva escura. A brisa fria rastejava por todos os cantos e a noite sorria, assim como fazíamos nós. Assim como fazia o homem, que adotara um parceiro. Assim como fazia um cão, que não dormiria ao relento e encontraria um lar.

Seguimos nosso caminho para o lado o oposto ao deles e é muito provável que jamais saibamos quaisquer notícias sobre cão e homem que traçaram seus destinos numa das curvas, num verão qualquer de Lumiar.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Desejo

Desejo

Hoje eu quis tomar banho de chuva
Mas, a noite corria alta
E eu estava sozinho

Hoje eu quis contemplar teu sorriso
Mas, o dia foi cansativo
E eu estava sozinho

Hoje quis o afago das tuas mãos
Mas, eu precisava trabalhar
E eu estava sozinho

Hoje eu quis dormir abraçado
Mas, a madrugada era quente
E eu estava sozinho

Hoje eu quis. E quero. Cada vez mais.
Mas, amanhã o dia virá
E te trará para mim
Para que eu não mais esteja sozinho

E amanhã
Quando a noite correr alta e a madrugada for quente,
E o cansaço de um dia de trabalho pesar,
Sorri para mim e pega minhas mãos
E me abraça forte sob a chuva
(se chover)
Que eu continuarei querendo. Cada vez mais.

Rio, 14/01/2016