segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Amanhecer de saudades

Amanhecer de saudades

Tu partes quando mal se abrem os portões do dia...
Hora sorrateira, traz o Sol minha solidão...
Imerso, outrora, em sonhos, desperto à realidade:
“Até breve, amor...” sussurro, sem alento,
Gastando meus últimos minutos ao teu lado
Olhando, tenso, o relógio, cujos ponteiros não param de rodar...

“Vai, anjo meu, desce a rua
E segue em teu trajeto, se tens de ir...”
Saudade pungente que me aperta o peito,
Guio-te até o portão, desejando com ardor
Um derradeiro beijo, um terno abraço –
Instante mágico em que meu corpo e o teu
Num só se amalgamam! –
Há tanta paz, há tanta calmaria neste átimo...
Outrora melancolia, agora felicidade!

E quedo-me só, todavia não lamento
Um longo dia que se segue até que voltes...

Aguardo teu retorno, tomado de nostalgia...
Mas sei que outra noite cairá sobre nós!
Ouvirei de novo teus passos, sentirei outra vez teu abraço!

Vem, Amor! Chega até mim!
Oscula de leve meus lábios,
Carrega-me contigo ao nosso leito
E sejamos felizes, antes do Sol nascer...

Gustavo Carneiro de Oliveira
21.09.2010

domingo, 12 de setembro de 2010

Tudo que eu queria te dizer

Em 1992, a minissérie “As Noivas de Copacabana”, exibida na TV Globo trouxe-me um enorme impacto profissional, quando optei por seguir carreira de advogado, após ver os debates inflamados entre a promotora, interpretada por Marieta Severo e o advogado agressivo na pele de Milton Gonçalves, no Tribunal do Júri dos últimos capítulos. Além da carreira, esta minissérie apresentou-me também a atriz Ana Beatriz Nogueira, no papel da noiva sobrevivente Fátima. Não foi seu primeiro papel na TV, mas foi o primeiro para o qual eu atentei dos meus 12 anos de idade...
Dali para frente, comecei a admirar bastante suas atuações, como no papel da sem-terra Jacira, da novela “O Rei do Gado”, da filha bastarda Duda de “Anjo Mau”, da oportunista Ana Paula de “Celebridade”, da temível Frau Herta, de “Ciranda de Pedra” e da fútil Ilana, de “Caminho das Índias”, dentre outras.
Mas minha admiração pela atriz resumia-se ao que eu conhecia do seu trabalho televisivo, o qual, vale frisar, muitas vezes deixou de fazer jus ao seu talento, colocando-a sempre em papeis secundários. Nunca antes a tinha visto num tablado.
Estará em cartaz no Centro Cultural dos Correios, de quinta a domingo, até o dia 24 de outubro, o monólogo “Tudo que eu queria te dizer”, baseado no livro homônimo de Martha Medeiros, com direção de Victor Garcia Peralta, que também assinou o monólogo “Não Sou Feliz, Mas Tenho Marido”. Trata-se de uma colagem de seis textos epistolares, não sei ao certo se ficcionais ou verídicos, mas nenhum assinado por ‘Martha Medeiros’. As cartas, de inquestionável sensibilidade, emocionam o espectador, pelo simples fato de serem cartas, tão raras em épocas de World Wide Web, e-emails, scraps, e tweets... Trazem aquele gosto de saudade, de quando esperávamos, às vezes dias, para conseguirmos a resposta de perguntas tão simples como “tudo bom com você?”.
Passado o choque de nostalgia, as emoções capturam o espectador das mais diversas formas. Da audácia na carta da recalcada Andressa para Ester, a esposa de seu amante; da triste saudade na carta da viúva Clô para seu falecido esposo; da decisão tomada pela mulher sonhadora, disposta a seguir em busca do seu amor perfeito, ainda que para isso tenha que trocar a vida real pelo paralelismo das noites dormidas; da paixão revelada pela terapeuta a uma de suas pacientes; do pavor na carta endereçada à Eneida, após as revelações de uma cartomante e a inexorabilidade da morte; e ainda, da intolerância de uma paciente por todas as convenções sociais, explicitada para o conhecimento do seu analista. As cartas interpretadas no palco traduzem todo tipo de emoção, em certos momentos tirando-nos o riso e em outros, convidando-nos a refletir acerca da nossa própria crueldade e do vazio da vida, colocando um peso sobre nossos ombros.
Tudo isso numa composição cênica de máxima simplicidade, na qual atriz e ambiente se fundem através da predominância da cor negra no figurino e no cenário, apenas com um foco de luz incidindo sobre si, enquanto, emolduradas pela música composta por Gabriel Mesquita, alternam-se as vidas, os contextos e, sobretudo, as personagens, visivelmente diferenciadas umas das outras pelo virtuosismo interpretativo da Ana Beatriz, que deita e rola sobre os textos da Martha, revelando a grandiosidade do seu talento e a cumplicidade firmada entre ambas, reforçada através da leitura de uma carta desta para aquela no início da apresentação e, ao final, da resposta enviada pela atriz à escritora.
O único aspecto que entra em choque com a proposta da peça, de revelar “textos escritos”, é a presença, em determinados momentos, de elementos de tal forma gestuais e de oralidade, fazendo-nos questionar como alguém conseguiria “escrever”, transcrevê-los em cartas, o que, de maneira alguma, empobreceu ou comprometeu a beleza do espetáculo. Até mesmo porque, se, por um lado, nestes poucos momentos, faltou veracidade à idéia de que o ato estava narrado em um texto escrito, por outro, a presença de tais elementos não verbais demonstrou o quanto nossa mente é capaz de divagar e captar emoções, ainda que postas de forma estática, impressas em folhas de papel.
Um belíssimo espetáculo, mais do que recomendado.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Teus olhos

Teus Olhos

Quanto cai a noite deste Inverno quente
Similar à calma tarde de um Verão
Sinto o rodopio, a dança intermitente
Dos fantasmas que renascem na escuridão.

Pensamentos torpes: vergastas e correntes
Que me tolhem os sonhos, atam minhas mãos!
Mas eis que na bagunça desta dor ingente,
Brota nos meus olhos dos teus a visão.

Redondas amêndoas, repletas de ternura,
Avançam sobre mim, penetram meu tormento.
De súbito sorrio: é finda minha tortura!

Calou-se a voz pungente! É morto o meu lamento!
Agora me acompanha... Que calma ou que loucura?
Que sonho lindo! Que contentamento!

(A tu, que com teus lindos olhinhos tortos, vem tornando mais reta a estrada sobre a qual caminharei)

Gustavo Carneiro de Oliveira
03.09.2010