terça-feira, 12 de julho de 2016

O não casar e o cuide da tua vida!

Sabe a idiossincrasia? Pois é. É a base da empatia. Aceitar que os outros são os outros e que aquilo que serve para os outros nem sempre serve para nós é fundamental. É necessário desconstruir. Sempre. Para que nunca traia a si mesmo, descubra seus limites. E ignore se a sociedade, a família, a escola, os amigos, ou quem quer que seja, tentar fazer com que você os ultrapasse.

Não. Eu não "estou passando da hora de casar"¹. E não. O ser humano não "nasceu para ser casado". Porque a maioria se casa, o não casar não é uma doença.

Sabe a mulher que se ofende com o otário machista que diz que ela não gostou de ser assediada apenas porque "o cara não a pegou de jeito"? Pois é. Não seja esse otário machista.

Sabe o gay que se ofende quando o imbecil lhe diz que ele só é gay porque ainda encontrou a mulher ideal? Pois é. Não seja esse imbecil.

Então, da mesma forma, é irritante e ofensiva essa mania que as pessoas têm de dizer que você não quer casar apenas porque ainda não encontrou a pessoa certa. Não sejam essas pessoas. Aceitem, simplesmente, que algumas pessoas não querem casar porque não querem casar. Porque gostam de si mesmas e de ter da solidão como opção. Porque se divertem com a própria companhia. Apenas aceitem isto. Pelamordejah!

Mas, e quando ficar velho, você vai ficar sozinho?!

Ah, então é isso. Casar é garantir alguém para ser uma espécie de cuidador de idosos? É deixar de viver como se quer viver o dia de hoje para garantir a existência de amanhã, quando a vida deixar de ser uma festa e passar a ser um fardo? Não, obrigado.

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¹ Casar aqui, tomado na acepção mais ampla: morar junto de alguém com se tem uma relação afetiva.

segunda-feira, 11 de julho de 2016

O Vazio do Discurso

Normalmente eu gosto de ver quem concorda comigo. Claro, como ser humano, dotado da prepotência de quem acha que está no topo da cadeia alimentar, eu gosto de ver gente que concorda comigo, já que, supostamente, tratando-se do meu pensamento, é presumível por mim mesmo que aquilo em que eu penso é o correto.

Mas, espero sempre, de quem pensa diferente, que me convença. Amo ser convencido. Mas, não de qualquer forma. Não me transformo com falácias ou premissas prontas. Quando abordo qualquer assunto polêmico, o que quero, de verdade, é que alguém me mostre, dentro da lógica, que eu estou errado, equivocado, incompleto. Algumas (muita) vezes, dou-me conta de tenho pensamentos não compartilhados pela maioria das pessoas que conheço. Por serem "meus pensamentos", prefiro achar que estou certo. Mas, admitindo que é um pensamento pouco compartilhado, acabo sempre me questionando "será que estou com razão?" e, nesta hora, espero sempre que alguém me mostre que não, que não estou certo. Algumas vezes, bem poucas, conseguem me convencer. E não enho nenhum problema em dizer "você tem razão, eu não tinha olhado por este ponto de vista". Na maioria das vezes, porém, não. Quase sempre me trazem argumentos rasos e ultrapassados, calcados em premissas prontas, que aceitam como dogmas e jamais questionam como teriam formado tais premissas.

Acho uma pena as pessoas terem preguiça de pensar para além das próprias premissas.

Imagino o quão triste deve ser a pessoa que diz "melhor mudar de assunto", no calor de um debate, porque não tem mais argumentos e não aceita a possibilidade de ter que mudar de ideia. Estas pessoas têm um apego tão forte às próprias convicções que preferem encerrar a conversa que aceitar que pode mudar. Quando uma discussão gera discordância, é lamentável ver que na maiorias das vezes as ideias se encerram porque as partes envolvidas preferem não brigar. Como se a discordância de ideias envolvesse necessariamente um conflito. "Vamos mudar de assunto, não quero acabar brigando com você."

Sempre que alguém me diz, neste contexto, "melhor mudar de assunto", interpreto isto como "pouco me importo com o que você tem a me dizer, você não irá me convencer" ou ainda, "meus argumentos são tão frágeis que prefiro não discutir mais para não demonstrar a fragilidade do meu pensamento". Qualquer uma das duas hipóteses significa a mesma coisa: "estou de tal forma preso às minhas convicções, que prefiro não me arriscar a mudá-las, mesmo que eu veja que eu devo". É triste demais ver essas pessoas escravas das próprias ideias, que não se permitem mudá-las, que não se permitem desconstruir conceitos tidos como absolutos, sem que jamais tivessem questionado o porquê.

Tenho o máximo do prazer quando consigo olhar para mim mesmo e me dar conta de que vinha reproduzindo pensamentos equivocados e raciocínios incoerentes; quando digo para o outro "você tem razão"; quando me permito olhar sob um prisma inédito até então. Adoraria conseguir compartilhar esta sensação com pessoas que se agarram com tanta força às convicções que, mesmo quando reconhecem a infalibilidade de determinados argumentos, rendem-se a eles e dizem "é verdade, você tem total razão", mas finalizam com "no entanto, continuo não aceitando".

Quem continua não aceitando aquilo com que não tem mais opções senão concordar é escravo da própria intransigência. E não ter liberdade para com as próprias ideias é o pior tipo de escravidão a que se pode submeter. Por isso mesmo que faço minhas as palavras do poeta, preferindo sempre ser essa metamorfose ambulante a ter aquela velha opinião formada sobre tudo.

domingo, 3 de julho de 2016

Cartas

Todas as cartas são comoventes. Pouco importa o teor. São. Ecos de um passado não muito distante, quando serviam de liame entre dois mundos, resgatando um passado um pouco mais distante, da remessa, trazido para outro passado, este um pouco menos, do destino.

Quem lê uma carta, vive um tempo ido. Cartas trazem consigo a incerteza. Quem escreveu a mim está para mim hoje como sua carta que me chegou às mãos? Uma carta é como a luz de uma estrela, que nos chega aos olhos tempos depois de ter saído de lá. E "lá" pode mesmo nem mais existir.

Uma carta é como um botão que une dois lados distantes de uma mesma camisa. É uma ponte entre passado e futuro. Enquanto me escreve, não sabe se serei ainda o mesmo que ora sou, quando chegar o momento de desdobrar o papel e começar a decifrar as letras na sua superfície.

Todas as cartas são comoventes. Não pode não ser comovente, se começa com a ternura de "meu querido" e finaliza com a pungência do "estou com saudades". Porque uma carta é uma ausência. É o sopro de voz de alguém que está longe. É a presença que não se cumpre, senão sob a forma da incompletude.

Ler uma carta é dublar uma voz que não se ouve, de quem falou ontem o que se escuta hoje; quando hoje ficou para trás, porque, afinal, quem ainda escreve cartas? Todas as cartas são comoventes. Há tantos dedos esperando com sofreguidão violar um envelope para desnudar uma missiva, quando há tão poucas mãos que se dispõem a segurar uma caneta para tatuar a superfície do papel.

Escrever cartas deixou saudade. Carta é nostalgia. Duas vezes nostalgia. Porque toda carta traz consigo saudade. Não são apenas letras, rabiscos e uma folha de papel. Uma carta é a falta que alguém faz a outrem. É um retrato de forma poética de um desencontro. Mas, por trazer consigo o desejo, a despeito de esfregar a distância na cara de quem escreve e de quem lê, uma carta é um presente. Raro. E comovente. Como somente as cartas podem ser.

Papo de Homem?

Vi nesta semana uma imagem em que se veem mulheres maquiadas, trajando roupas curtíssimas, posando de costas para a foto, em poses que certamente evidenciam partes dos seus atributos físicos, também conhecidos como bunda. Acompanha a imagem uma legenda em que se lê algo que, se não é isso, é parecido com isso (realmente eu não memorizei, o nível de imbecilidade é tão grande que eu preferiria tê-la esquecido): “são mulheres assim que vivem dizendo que nenhum homem presta”.

A nítida intenção do texto é infamar a imagem dessas mulheres que, tachadas por “vagabundas”, “putas”, “galinhas”, “piranhas” e outros adjetivos pejorativos, não seriam merecedoras de homens de caráter. De acordo com a lógica assustadora da legenda da imagem, restam-lhes apenas os homens que não prestam, aqueles de índole compatível à desse tipo de mulher que, por vestir roupa curta e desejar mostrar partes do seu corpo, não é digna, tampouco merecedora de “alguém que preste”.

Cansa-me profundamente ter de repetir à exaustão o clichê de que roupa nenhuma define caráter, comprimento nenhum de vestido determina merecimento de castigos ou benesses e não me alongarei nesta discussão. Assusta-me pensar que, tão pouco tempo depois da imensa repercussão de um caso de estupro coletivo, no qual a índole da menor estuprada foi reiteradamente posta em xeque nas mídias de todo país, pessoas supostamente esclarecidas compartilhem imagem com este tipo execrável de legenda machista, preconceituosa e estúpida.

Postagem estúpida, extraída de uma página intitulada Papo de Homem (que não deve ser confundida com esta outra aqui, PapodeHomem), é quase inevitável deduzir que os responsáveis pela confecção da montagem e seu respectivo compartilhamento foram homens (não desconsiderando ainda a parcela de mulheres machistas que há, por mais incoerente que isto possa parecer). Sem cérebro, mas homens. E é para esses homens que eu respondo: não é esse tipo de mulher que diz que homem nenhum presta, mas são, sim, esses tipos de homem que fortalecem a ideia errônea de que nenhum de nós vale alguma coisa.