quarta-feira, 25 de março de 2020

Coronavírus e a função social da propriedade

Aos coleguinhas neoliberais de plantão, que acreditam na sacralidade do direito à propriedade como se fosse um direito natural, inerente ao ser humano, vou dizer: o próprio direito é uma convenção e não existe uma natureza no direito. Em algum momento da história, classes dirigentes de sociedades estabeleceram o que é e o que não é direito e quem pode ou quem não pode gozar dele. Nem vou entrar nesse debate, porque não quero perder o foco.

Mas, para quem acha que a propriedade privada é direito absoluto e se sobrepõe a todos os outros, vou lembrar que nossa constituição prevê, em seu artigo 5º, XXIII, que a propriedade privada atenderá à sua função social, o que significa que o direito à propriedade privada deve se submeter aos ditames necessários à manutenção da coesão social. Ou seja, em resumo, se a manutenção da sua propriedade privada prejudicar a coletividade, um abraço para sua propriedade privada!

E neste sentido, a constituição também determina, em seu artigo 170, III, que a ordem econômica, com a finalidade de ASSEGURAR A TODOS UMA EXISTÊNCIA DIGNA EM CONFORMIDADE COM OS DITAMES DA JUSTIÇA SOCIAL, deverá ter como princípio a função social da propriedade. Isso significa que é uma balela e, como tal, deve ser rechaçada, todo esse papo de que o direito de lucro do dono da Havan, do dono do Madero, do Roberto Justus, e de cada um desses merdas são dados por Deus.

É por isso que é necessário taxar grandes fortunas, sim. É por isso que imposto não é roubo. É por isso que o lucro obtido sobre a exploração alheia precisa ser combatido.

E é por isso que medidas de combate ao coronavírus devem ser adotadas. Em vez de continuar lambendo o saco do empresariado que não para de se vitimizar, como o Véio da Havan que, para chantagear o governo, ameaçou demitir 22 mil empregados, Jair Bolsonaro deveria obrigar imediatamente os bancos a lhe conceder empréstimo compulsório para subsidiar a complementação de renda das pessoas mais necessitadas, e não obrigá-las a sacarem seu próprio FGTS para gerirem a própria saúde.

Mas, Guto, obrigar o banco a conceder empréstimo? Pode isso? Pode. Tá lá no artigo 148, I e II:

"Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios:
I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência;
II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional (...)."

Não se engane com medidas paliativas como liberação de FGTS. Isso é varrer a sujeira para baixo do tapete. O governo não está olhando para o trabalhador, quando, depois de congelar por vinte anos investimentos em saúde e em educação, sucateando o SUS e as pesquisas públicas nas universidades, resolve liberar o saque do FGTS para evitar "paralisar a economia". Quando faz isso, o governo está dizendo para o trabalhador: "deixei o estado se omitir, deixei de investir em saúde pública, deixei de garantir aos cidadãos os seus direitos sociais, e agora quero que vocês usem seu dinheiro guardado para poderem gastar por conta própria aquilo que o estado deveria ter garantido e não fez."

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