sexta-feira, 3 de abril de 2020

Por que chamamos o motorista do Uber de Uber e não de uberista?

Pois acredite, este não é um questionamento inútil e nem é para ser engraçado. Já existe uma análise dentro do direito trabalhista e da sociologia do trabalho que questiona os perigos desse hábito. Quando a gente chama um TRABALHADOR pelo nome da sua EMPRESA, a gente o despersonifica, desumaniza. E quando despersonificamos a pessoa, tirando dela a sua humanidade, levamos junto a sua possibilidade de ser sujeito de direitos.

Ou por que foi tão necessário coisificar o negro na nossa sociedade escravagista, e por que nossa sociedade de consumo ainda o faz, perpetuando a exclusão social? A propaganda nazista, ao comparar judeus a ratos, desumanizou toda uma população, tornando menos desconfortável ao cidadão alemão o ato de abrir o gás tóxico ou de acender os fornos. Não viam "pessoas", viam "judeus", que eram o mesmo que "ratos".

O processo de invisibilização da pessoa é lento e quase imperceptível. Despersonificar o MOTORISTA DO UBER, transformando-o no UBER, tira do usuário a responsabilidade sobre uma PESSOA, que tem um trabalho precarizado e não reconhecido como vínculo de emprego pela maior parte do Judiciário. E se a sociedade não enxerga o ser humano sendo explorado, passa a não se importar. Deixa de comprar o barulho, mantendo muito confortável a situação da EMPRESA, que lucra absurdamente em cima do trabalho de uma PESSOA, e que tem publicidade gratuita entre seus usuários, quando não elogiam o motorista e sim o aplicativo.

Contratamos o Uber, o iFood, o Rappi, e pouco nos importamos com as condições que tais empresas fornecem aos "uberistas", "ifoodistas", "rappistas". E quem é desumanizado se torna invisível. Não importa se está chovendo canivete, nossa fome não se preocupa se UMA PESSOA vai se molhar e passar frio para trazer nossa comida. Apenas pensamos que um aplicativo fará isso por nós.

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