sábado, 20 de abril de 2019

A Hipocrisia Nossa de Cada Dia ou O Poder do Nosso Discurso Vazio

(Originalmente publicado no meu Facebook em 10 de janeiro de 2017)

Se você tem uma foto feita com um amigo negro naquele verão de 1997 e bate no peito para dizer que não é racista, tenho uma notícia triste para te dar: sua foto e seu amigo não garantem que você não seja. Especialmente se você já pediu para esse amigo se vestir mais arrumadinho porque, sabe-como-é-né, as pessoas são preconceituosas e poderiam achar que ele era um pivete.

Você tem um amigo gay, mas preferiria que seu filho fosse hétero e quando você vai xingar um cara, a primeira ofensa que lhe salta da boca é "viado!", lamento dizer isto, mas você pratica homofobia, sim. E não adianta ficar feliz porque o seu amigo musculoso com "jeito de hétero" arrumou um namorado tão musculoso e com "jeito de hétero" quanto: se você diz que pode até ser gay, mas não precisa ser tão afeminado, sua homofobia está num nível quase patológico.

Quando você abre a boca para dizer que é esquerdista, mas atravessa a rua e olha com desconfiança para todo mendigo que aparece na calçada em que você caminha, você não está sendo diferente em nada do reacinha que diz que na "favela só tem bandido". Se a miséria humana lhe causa mais temor pelo celular no seu bolso que solidariedade e empatia pela opressão que, de algum modo, você também sofre, sinto muito, mas isso não é esquerdismo. É estratificação social. Mesmo que você insista em dizer a seu favor que um dia você até subiu a Favela da Rocinha para ir ao aniversário daquela sua amiga de escola.

E não adianta você dizer que não é machista se você chega cansado do trabalho e acha um absurdo a sua mulher querer que você ainda lave os pratos!

Para justificar sua hipocrisia, não se paute na exceção daquele seu amigo "que é gay, mas nem parece", daquela negra que "por acaso é linda" ou daquela vizinha que você defendeu quando apanhava do marido. Viver uma ideologia inclusiva é muito mais do ter um amigo que.

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