terça-feira, 1 de março de 2016

Insônia

Há três horas adormeci. Há uma hora e meia acordei. Um tique-taque insuportável de um relógio velho reverbera em cada centímetro de cada parede no silêncio da madrugada. E o sono não volta mais. Fugiu. Como foge um presidiário escorregadio que cai num túnel que liga o nada ao nada e nunca mais é visto.

Ao longe, carros vão e vêm. Indo para e voltando de. Sabe-se lá para e de onde. Talvez para o mesmo lugar secreto para onde escapou meu sono. Que em sua fuga não encontre pelo caminho um motorista incauto que o receba de braços abertos, olhos fechados e vidros estilhaçados. Se fugiu, que fuja para bem longe. Para além das autoestradas.

Não muito longe um galo canta. A noite é fresca, ao menos. E pela janela ouço a serenata que um grilo não faz para mim.

Em quatro horas precisarei estar de pé, para cumprir meu ofício de lutar contra o sono. Moleque travesso que deveria estar aqui para vencer uma batalha agora e não para me encontrar desprevenido ao amanhecer, tornando mais longas as horas do dia.

O chá me relaxa, as palavras se perdem. E os carros continuam indo e voltando. Ouço-os claramente, mesmo com cada tique e cada taque deste relógio que eu adoraria atirar contra a parede. Passei da idade de ter insônia.

Teimoso que sou, rastejarei lentamente para a cama, onde, resignado, esperarei. Fecharei meus olhos e ficarei à sua disposição. Totalmente entregue, totalmente vulnerável, aguardarei calmamente que ele volte de sua orgia noturna em paragens desconhecidas. Aguardarei, como quem se humilha aguardando um amante que não chega. E se ele chegar, apenas dormirei. Sem questionar. Sem brigar. Dormirei. E me sentirei feliz porque depois de sua farra noturna, terá sido para mim que o sono terá retornado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário