segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Complexo de vira-latas do advogado

O advogado precisa acabar com seu complexo de vira-lata. A baixa autoestima dominante no exercício da profissão é inconscientemente manifestada sob as mais diversas formas!

A titulação excessiva concedida ao juiz no endereçamento de uma petição. "Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito..." – que pode ser substituída de forma mais elegante e mais adequada à gramática formal, por um breve "MM. Juiz" ou apenas "Juízo" (que é a minha preferida, já que quem julga é o juízo enquanto braço do Estado, e não a pessoa do juiz) – além de soar cafona, revela uma espécie de subserviência do advogado ao juiz, como se houvesse uma hierarquia funcional, e o segundo estivesse acima do primeiro, o que não é o caso.

Da mesma forma, o excessivo uso de letras maiúsculas para tudo. Nomear recursos, referir-se às partes, mencionar palavras como "juiz" ou "tribunal". Se a própria lei (que alguns insistem em chamar de "Lei"), que conceitua os recursos, não se refere a eles em letras maiúsculas, por que diabos devo eu dizer "Apelação", "Agravo", "Embargos" quando não estou iniciando uma frase ou não estou mencionando um nome próprio? Quem disse que é bonito escrever "Autor" e "Réu", "Apelante" e "Apelado"?

Sobre a atribuição de adjetivos os mais esdrúxulos, a todo e qualquer substantivo, desta eu já nem preciso falar mais. Mais sério que usar tais atributos são suas supostas abreviações que não encontram em qualquer dicionário um embasamento real. Se eu posso escrever "sentença", não escreverei "Sentença" e tanto menos "Douta Sentença" ou "d. sentença". Poucas coisas me irritam tanto quanto "D. Sentença", "R. Decisum", "V. Acórdão", "C. Câmara" ou "E. Tribunal", em que "D.", ".R.", "V.", "C." e "E.", significam, respectivamente, "Douta", "Respeitável", "Venerável", "Colenda" e "Egrégio". Quem, diga-me, quem (?!), se refere a alguém como "colendo" para lhe atribuir valor?! Se alguém me cumprimentar na rua, chamando-me de "egrégio" eu juro que me sentirei ofendido!

E aí, o advogado, este que se põe, aparentemente de propósito, abaixo de qualquer um – até de uma "d. sentença" (que eu sempre vou ler como "dona sentença") – depois de gastar todas a letras maiúsculas de seu alfabeto, naquele trechinho em que se refere a si mesmo, menciona sua profissão de forma quase disfarçada, em uma letrinha minúscula, quase desaparecida naquela petição verborrágica, como se sentisse vergonha de estar ali, dentre tão ilustres, doutos, colendos e egrégios: "o Autor vem, por intermédio do seu patrono, mui respeitosamente, diante deste Exmo. Sr. Dr. Juiz, suplicar..." Suplicar?! Pelamordedeus, colega! Suplicar?! Sempre que leio isto, vejo minha cachorrinha se aproximando de mim, depois de levar uma bronca, com o rabinho entre as pernas, a cabecinha baixa, mal me encarando nos olhos, suplicando para não ser castigada por roer um chinelo. E alguém identificou a referência ao advogado na frase de exemplo?

Pois é, "patrono" e "causídico" são só alguns dos sinônimos jurídicos utilizados, atrás dos quais se esconde aquele que deve brilhar em sua petição: o advogado. Eu jamais suplico coisa alguma em nome do meu cliente! Apenas venho "pleitear deste juízo", que preste sua obrigação de prestar o que lhe é requerido. E venho como advogado, nunca como "procurador", "causídico" ou "patrono". E nem precisa ser com "A" maiúsculo, basta que seja com dignidade.

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