quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

A Cura da Transfobia e a Ressaca Depois do Carnaval

Depois de duas semanas polêmicas, nas quais falei de racismo, suburbanos e gays, vi, durante o Carnaval, circulando nas redes sociais, umas fotos de um rapaz bonitão beijando uma travesti. Vários ângulos, vários cliques e vários comentários, todos repetidos à exaustão. Desde os cliques, que sempre denotavam o imenso prazer do rapaz e do travesti de estarem um com o outro; aos comentários, que sempre mencionavam, em tom constrangedoramente jocoso, o suposto papel de trouxa que o rapaz teria feito ao ser enganado por uma travesti.

Depois de falar sobre tantos temas capazes de despertar a ira de muitos e o apoio de outros tantos, num intervalo tão curto de tempo, prometi a mim mesmo que não comentaria sobre o caso. Mas, eis que ainda hoje, passados mais de sete dias depois do Carnaval, parece-me que não se passaram os efeitos colaterais da bebedeira e dos desvarios típicos da Festa da Carne. E assim, numa constante embriaguez de ideias turvas, a capacidade de falarem besteiras parece não ter fim. Sim, ainda hoje, vi o assunto ser trazido à tona outra vez.

Novamente o mesmo tom ridicularizando o rapaz. Sempre o pobre rapaz, vítima das artimanhas da travesti do mal, enganado em sua honra, ridicularizado em sua masculinidade profundamente abalada. Poderia discorrer agora sobre este papel da vilã sórdida e enganadora atribuído à travesti e o papel de mocinho inocente enganado atribuído ao rapaz, e com um elo de ligação para abordar o papel da enganadora Eva ao trouxa do Adão, discorrer de forma prolixa sobre feminismo e misoginia, mas preferirei não fazê-lo. Não ainda.

Em uma semana na qual um pastorzinho com "a cara do leão" devorador de ovelhas trouxe novamente à mídia a então ultrapassada e medieval discussão sobre cura gay, achei por bem focar nos temas homofobia e transfobia.

E vendo novamente a repercussão das fotos do Casal Frisson deste Carnaval, a pergunta que faço é: Será mesmo que o rapaz foi enganado? Desdobrando o questionamento em inúmeras outras perguntas, será que ele não pode ter escolhido deliberadamente uma travesti para se relacionar durante o Carnaval, ou quem sabe, para além das festividades? O fato de o rapaz ter um perfil físico capaz de imperar no imaginário e nos desejos de muitas mulheres e de muitos homens tira de si o direito de escolher uma travesti para beijar durante o Carnaval?

Em uma semana na qual se falou sobre cura gay, acredito que seria muito mais saudável se tramitasse no Congresso uma lei que instituísse a cura da homofobia e da transfobia. Até porque, de acordo com a Organização Mundial de Saúde, homossexualidade não é uma doença, fobias são. Claro que este projeto de lei que prevê a cura da homofobia e da transfobia não passa de uma brincadeira utópica da minha cabeça. Mesmo porque, ainda de acordo com a OMS, a cura de algumas fobias pode ser obtida através de cirurgias que retiram parte do cérebro do paciente. E no caso de transfóbicos e homofóbicos, como retirar parte de um órgão que estas pessoas não têm?

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