domingo, 25 de junho de 2023

Arte Drag e Heteronormatividade

Como entretenimento, não curto muito as apresentações de drag queens. Até acho interessante a composição de figurino e maquiagem, mas de uma forma geral, acho toda a performance um pouco cansativa e não costumo ser tocado por esse tipo de manifestação artística.

Como resistência, porém, a arte drag é uma manifestação que abraça pessoas LGBTQIAPN+ e seus corpos frequentemente dissidentes, concedendo-lhes um lugar de acolhimento, respeito e segurança. E isso não é pouca coisa. É exatamente aí que a parada me pega! Não me entreter com alguma coisa diz mais sobre mim do que sobre a coisa em si.

Quando estamos falando de sociedade, a importância da minha individualidade, do meu "gosto pessoal" é praticamente irrelevante, especialmente quando considero que a formação do meu "gosto pessoal" se deu a partir de uma ótica machista e homofóbica entranhada à minha revelia quando eu ainda era criança e adolescente e me colocava no lugar supostamente seguro de me afastar daquilo que o machismo e a homofobia da nossa sociedade careta e conservadora condenavam.

Desta forma, na construção da minha personalidade que demandava afastamento de todo tipo de signo que pudesse me colocar na posição de pessoa LGBTQIAPN+, fui tirando do meu repertório cultural algumas formas de arte que estariam — na minha visão limitada de mundo da época – relacionadas ao "meio LGBTQIAP+". Passei a emular um tipo de masculinidade que nunca me foi orgânica, mas que eu via como uma necessária maneira de me manter seguro. Era um erro, claro, mas esse é assunto para outra reflexão. Dessa forma, afastei-me da música pop e suas "divas", que eu insistia em ver como "música de viado", e também da arte drag.

Entender como se dá um processo não necessariamente pressupõe o cancelamento dos seus resultados. Assim, mesmo entendendo como se deu a formação dos meus gostos por influência social, não consegui mudá-los. Não todos. O aspecto elitista entranhado inconscientemente na formação das minhas preferências artísticas me afastou bastante das culturas dita "populares", o que abrange "músicas das periferias", "arte gay", dentre outras.

No entanto, entender como se deu esse processo de construção das minhas preferências, se, por um lado, não me garantiu (ainda) a alteração daquilo que eu gosto ou desgosto, por outro, me obriga a entender que manifestações artísticas não devem ser hierarquizadas. Respeitá-las é uma obrigação. E no caso de uma arte que representa e acolhe grupos oprimidos e minorizados, como é o caso da manifestação drag queen, mais do que respeitar, é necessário valorizar e aplaudir.

sexta-feira, 23 de junho de 2023

Prioridades do Estado Burguês e a Consequência Nefasta

A Taxa Selic é a taxa básica de juros que o Estado deve pagar aos proprietários de títulos de dívida pública. Cada 1% da taxa impõe um gasto médio de 60 a 70 bilhões de reais em juros de dívida pública. Isto significa que, estando em 13,75%, ao final de 2023, o Brasil terá um gasto variável entre 700 a 815 bilhões de reais em juros aos proprietários de título de dívida pública. Basicamente bancos e rentistas. O orçamento para 2023 na área da educação é de R$ 142 bilhões e para saúde é de R$ 179 bilhões, de acordo com o Portal da Transparência. E o Congresso aprovou há relativamente pouco tempo o arcabouço fiscal para limitar ainda mais os investimentos públicos nessas áreas. A desculpa é que não há dinheiro.

Não há dinheiro para investir em saúde e educação, mas há 800 bilhões para pagar juros a banqueiros. A manutenção dos juros altos na Taxa Selic causa uma desaceleração na economia, tendo em vista que passa a ser mais atrativo investir em títulos da dívida pública do que em qualquer atividade empresarial. Quem vai querer ter dor de cabeça para lidar com as burocracias e riscos empresariais quando pode simplesmente investir em títulos da dívida pública e viver de juros? Quem produzirá riqueza efetiva quando o rentismo parece ser tão mais atrativo? Com isto, a tendência é haver aumento de preços por desabastecimento, aumento do nível de desemprego e queda no poder de consumo da população.

Enquanto este cenário distópico se descortina, as lideranças das esquerdas seguem em um silêncio constrangedor. Os ditos esquerdistas não organizados, aquela galera que tá aqui nos meus contatos e nos seus postando status de que o amor venceu ainda se finge de cega, de surda e de muda, calando-se diante deste descalabro patrocinado pelo Estado brasileiro, com a convivência do governo federal! Importam-se mais em dizerem "para isso que eu fiz o L" para cada declaração vazia que o Lula dá, na tentativa de afrontar aquele parente bolsonarista e justificar a eleição do presidente, como se ainda vivêssemos em campanha eleitoral. É mais importante lacrar nas redes do que pensar no futuro.

É preciso que as frentes de esquerda pressionem o Congresso e o Governo Federal para que Campos Neto seja demitido do Banco Central e que a política de juros seja alterada para reduzir a Taxa Selic. Também urge que seja revogado o arcabouço fiscal e qualquer tipo de limitação fiscal que imponha teto de gastos para investimentos públicos em prol da população. Senão, ano que vem, quando você estiver sem emprego postando link de vaquinha virtual para comprar comida e pagar aluguel, não lamente a situação que seu silêncio e sua inércia terão ajudado a consolidar.

Ah, e se isso se mantiver, Bolsonaro volta! Era só isso mesmo.

quinta-feira, 22 de junho de 2023

Larga esse celular!

"Larga esse celular e vai socializar!"

Amade, não adianta tirar celular da mão da criança quando sua geração inteira vive conectada. Se tiram o aparelho da sua mão, ela olha para o lado e vê todas as outras pessoas conectadas, nada lhe resta de sociabilidade. Não há com quem interagir quando todes ao seu redor mantém seu foco no celular. Em vez de obrigar o adolescente ou a criança a se afastar da tela, busque alternativa para lhe proporcionar crescimento dentro da linguagem que ela entende. Hiperconectividade é uma realidade e faz parte do processo socializador contemporâneo.

"Na minha época a gente conversava olhando no olho e era muito melhor". Isso é só um reacionarismo barato.

A luta pelo direito é a luta da força

Direito não é uma coisa que você tem, como dado pela natureza, inerente à sua condição humana. Talvez seja algo que você deva ter, mas não que você tenha de fato. Direito é algo pelo qual você luta e conquista a partir da força em um embate permanente pela sua obtenção e, sobretudo, por sua manutenção.

Num cenário político, jurídico e institucional como o Brasil contemporâneo, o direito é apenas uma ficção, uma lenda urbana talvez. O Estado controlado pela burguesia não atua para garantir o seu direito, tampouco o meu, que sou, assim como você, classe trabalhadora.

O judiciário brasileiro é encastelado, reacionário e atua como emissário de um antigo regime, no qual o julgador faz também o papel de legislador. Diuturnamente verificamos juízes irresponsáveis — não como exceção, mas como regra — nada comprometidos com o "meu direito", julgando casos à revelia da lei e do lastro probatório produzido nos autos.

Antes, o compromisso desses aristocratas togados num estado supostamente democrático é com seus próprios privilégios, consubstanciados em salários astronômicos e nos poderes que lhes são concedidos por quem manda na organização da sociedade.

A nós, reles mortais que confiamos ao Estado a prerrogativa da nossa existência, nada resta senão lutar. E quando os violadores da lei são o próprio Estado, a desobediência passa a ser um dever e a violência para garantir o direito para o qual esse Estado constituído por parasitas togados insiste em fechar os olhos vira legítima defesa.

Você não tem direito. Você deve lutar por ele. E essa luta não passa pela institucionalidade de um Estado a serviço de uma classe dominante, que declara a existência do seu direito na letra vazia da lei para em seguida usurpá-lo pela atuação incompetente de um judiciário alheio à realidade de quem trabalha para sustentar a sociedade.

A luta pelo direito é a luta da força. E a força resulta da união de quem pretende lutar. Não pense que o Estado lhe concede um direito por liberalidade e benevolência. O que motiva o Estado é o medo: o medo de que você se junte comigo e com o outro e que juntos nos levantemos contra seus desmandos.

O direito que você acha que tem só existe quando a correlação de forças permite. E acredite: do lado de lá eles estão lutando diariamente para continuar massacrando a mim e a você. E o judiciário é um dos capangas dessa classe organizada para nos destruir.

quarta-feira, 21 de junho de 2023

Diversidade?

No mês do orgulho LGBT, precisamos lembrar que a luta pelos direitos da população LGBTQIAPN+ deve passar necessariamente pela luta de classes. Não é de hoje que o capitalismo se apoderou das pautas LGBT, promovendo uma diversidade de fachada, excludente e higienista, basicamente focada na letra G da sigla. São muitos os corpos sarados e brancos de homens gays com algum poder de consumo promovendo empresas explorando a pauta da diversidade. Quem pode se hospedar em um hotel de luxo na Avenida Paulista em dia de Parada LGBT representa a pessoa trans periférica e preta que precisa ralar o dia inteiro para ganhar um salário mínimo num subemprego qualquer? ISSO NÃO É DIVERSIDADE! Quando somente o homem gay cisgênero de corpo padrão for lembrado, não será diversidade, será capitalismo. O mesmo capitalismo que empurra outros corpos LGBTQIAPN+ para fora do "cis-tema", para serem mão de obra barata em um telemarketing qualquer, para não ser visto pelos olhos conservadores de uma sociedade careta.

terça-feira, 20 de junho de 2023

Etarismo também é estrutural

Nossos discursos nos traem com muita facilidade. Dia desses, numa conversa sobre envelhecimento, etarismo, crise dos 40, dos 30, uma amiga comentou: "não tenho nenhum problema com a minha idade, não me sinto uma pessoa de 40 anos, sinto-me ainda com 20".

Ficam as perguntas: o que é ter 40 anos? E o que é ter 20?

Minha amiga, que é pouca coisa mais nova que eu, não tem nenhum problema com sua idade. Mas, sem se dar conta, atribuiu valores específicos às idades, como se um número conferisse em si mesmo um valor para além da grandeza numérica de contagem do tempo.

Lendo nas entrelinhas, ao dizer que "não se sente uma pessoa com 40", minha amiga quis dizer "não me sinto velha". E a ideia de "velha" aqui veio carregada de sentido, de qualidades ocultas, subentendidas, e não exatamente positivas. Como se uma pessoa de 40 sentisse algo específico, inerente aos seus 40 anos. Algo ruim. Algo do qual se desvencilha quando se diz que não tem "nenhum problema com a idade", isto é, como se ter determinada idade fosse um problema e, demonstrando não ter esse tipo de problemas supostamente inerentes à idade de 40, argui que se sente com 20.

O que é "sentir-se com 20"? É ser jovem? Jovialidade é um atributo constantemente buscado na nossa sociedade, razão pela qual o etarismo — a discriminação de pessoas por causa das suas idades — se faz tão presente. Quando negamos um problema com a idade, dizendo que sentimos como se nossa idade não fosse aquela do problema, mas outra, correspondente à sua metade, estamos inconscientemente e involuntariamente atribuindo valores negativos ou positivos às numerações.

Eu tenho 43 anos e me sinto com 43 anos. Também não tenho problema com a idade. E por isso mesmo, apenas tenho a minha idade e me sinto nela. Porque ela é só um número. Se me sinto jovem, velho, disposto, cansado, belo, feio, ou qualquer outro juízo valorativo que possa ser atribuído a um corpo que sofre os efeitos do tempo, eu estarei me sentindo jovem, velho, disposto, cansado... E não "me sentindo com 20, 30, 40 ou 43 anos".

Minha amiga não é etarista. Não conscientemente, não deliberadamente. Mas, sem perceber, usou em seu discurso significados (velho, novo, jovem etc) tão entranhados nos significantes (o número de anos que vivemos), que, sem a intenção, reproduziu os mesmos preconceitos etaristas estabelecidos socialmente. É preciso estarmos atentos para não reproduzirmos e perpetuarmos preconceitos.

Fazemos o mesmo quando dizemos que alguém tem "cara de pobre", ou "cara de ladrão", "cara de quem ouve pagode" quando nos deparamos com determinadas características físicas da pessoa. Ou ainda, quando pelas mesmas características, supomos que aquela pessoa trabalha na loja em que estamos comprando. Mas, aí já estamos indo para uma esfera mais grave: a prática de um crime. E essa discussão fica para uma outra ocasião. Estejamos sempre atentos com o poder que o nosso discurso tem de nos trair.

sexta-feira, 16 de junho de 2023

O Totalitarismo do Google

Você sabia que o Big Brother é uma alusão ao Estado "totalitário" soviético, do livro "1984", do George Orwell? Na obra o autor fazia uma crítica à política stalinista e projetava um tempo futuro, no ano de 1984, em que todas as casas teriam câmeras instaladas, para que o Estado pudesse observar tudo que os cidadãos faziam, inclusive em suas vidas privadas. A inteligência artificial que olhava cada casa era o Big Brother, o Grande Irmão, o olho do Estado vendo tudo. Propaganda anticomunista rasteira. E como não podia deixar de ser, a história veio a mostrar que os capitalistas são justamente aqueles que fazem exatamente aquilo que depois atribuem aos comunistas.

Cada celular, cada acesso ao Google, cada dado lançada no Facebook conferem poder para espiar sua vida inteira a essas big techs que controlam o mundo e interferem, inclusive, na política e na geopolítica mundial (dá um Google em "Cambridge Analytica brexit eleição Trump" e depois volta aqui para me dizer o que achou). São grandes corporações, capitalistas, que, na posse de todos os nossos dados, manipulam o destino de nações inteiras. De olho em tudo que fazemos, controlam tudo que escolhemos. E definem os rumos da sociedade global, sob o aval de Estados que sequer regulamentam os acessos que essa burguesia têm a toda a nossa intimidade. Quem é mesmo totalitário agora?

No comunismo tem The Voice?

Quando você tem talentos que precisam ser votados num programa como The Voice ou Ídolos ou X-Factor para que UM saia vitorioso e receba investimentos para se tornar uma celebridade (e muitas vezes não se torna e cai no ostracismo), fica explícito o fracasso do capitalismo como sistema dentro do qual as pessoas possam explorar suas potencialidades. Quantos artistas geniais estão atrás de um balcão ganhando um salário mínimo sem que lhe seja dada oportunidade para desenvolver o seu potencial artístico? E se fosse só questão de talento, por que todas as outras pessoas talentosas que participam desses programas desaparecem sem alcançar o estrelato?

No capitalismo, quem faz o artista não é seu talento, mas o dinheiro que se investe em sua carreira, que nada mais será senão uma fonte de lucro para o empresário que gerencia a carreira de quem produz, roubando-lhe mais valia. Quando o lucro deixa de ser um fim, a arte deixa de ser um meio e passa, ela própria, a ser um fim em si mesma. Apenas o fim do regime de acumulação de capital possibilitará que cada um possa explorar seus talentos e produzir sua arte conforme seu interesse. E esse estado só chegará com o socialismo.

quarta-feira, 14 de junho de 2023

Padrão de beleza no capitalismo

Primeiro os veículos de mídia criam um padrão de beleza inalcançável para cerca de 70% da população brasileira, que vive com até dois salários mínimos por mês. Assim, atua na sua autoestima, fazendo sentir-se fora dos padrões de beleza que você acredita ser "o natural", por estar tão massificado em toda a mídia e toda a moda. Você sente a necessidade de consumir qualquer promessa para mudar sua aparência e se encaixar naquele padrão inalcançável. Está criado um nicho de mercado. Alguém investe num produto ou procedimento qualquer que prometa mudar a sua aparência. E você compra. Mas, você faz parte de 70% que ganha até dois salários, lembra?

Para conseguir comprar o que quer, precisa trabalhar dobrado, movimentando todo esse sistema. Enquanto isso, a mesma mídia que impõe um padrão de beleza também injeta uma dose de meritocracia, fazendo com que você se culpe pelo próprio "fracasso", por não ter alcançado a beleza padronizada, por não ter enriquecido como esperado, por não ter tempo para viver. "É que você não se esforçou o suficiente", dizem. E você acredita. Então, esforça-se ainda mais e trabalha em triplo. E assim você vai alimentando todo um sistema que rouba sua vida e que só irá parar quando você o destruir. Alimente seu ódio. Ame-se imensamente, mas odeie com toda força o sistema dentro do qual você está.

Quem tem medo da fama do HIV?

Lembro quando num app de pegação, já faz uns anos, eu usava no perfil um texto dizendo que achava um desrespeito aquele app ter um campo para a pessoa expor sua sorologia, que evidentemente seria um marcador social, dado o estigma que pessoas que vivem com HIV enfrentam. E que eu me recusaria a preencher aquilo, como se tivesse obrigação de informar ao outro, quase como um alerta, caso eu vivesse com o vírus, ou exibir como um selo do Inmetro um status sorológico negativo.

Por conta desse trecho na descrição do meu perfil, recebi inúmeras mensagens das mais diversas. Desde gente me discriminando por entender que eu seria uma pessoa com HIV até gente me "alertando" que "poderiam pensar" que eu vivesse com HIV, pressupondo pela minha sorologia como negativa. Mas, a que mais me chamou atenção foi a de uma pessoa que vivia com HIV, mas que não tinha a sorologia exposta e que me disse que ler aquela mensagem havia lhe dado um alento.

De algum bairro distante aqui deste mesmo Rio de Janeiro, aquela pessoa desabafava sua solidão pelo medo do estigma e do esforço que fazia para guardar segredo sobre ser alguém com HIV. Naquela ocasião eu tive certeza que estava fazendo a coisa certa. Havia também aquelas pessoas que ficavam em dúvida e continuavam na dúvida quando me perguntavam, porque eu me recusava a responder. Devolvia com outra pergunta:

"Isso importa?"

Quando respondiam que não, eu mantinha a conversa. Depois até matava sua curiosidade e dizia. Aos preconceituosos de plantão, eu não perdia meu tempo. Exceto eventualmente para lhes dizer como se dá uma transmissão e como se pode prevenir uma infecção. Às vezes dizia ao final: "se você entendeu, pare de agir feito babaca!" antes de bloquear. Dias atrás, participando de um seminário sobre prevenção do HIV e direitos humanos de pessoas trans, e ouvindo seus relatos sobre estigmatização que já sofreram e sobre acolhimento, achei reconfortante pensar que num app de pegação em algum momento, meu perfil serviu de acolhimento a alguém, inconscientemente.

Ficou ainda mais nítido para mim que é necessário ocupar todo e qualquer espaço, inclusive um app de pegação, para tornar a prevenção do HIV um assunto corriqueiro. Hoje até julgo menos o campo no formulário do app para a pessoa expor sua condição sorológica. Há quem faça questão de ter sua sorologia positiva exposta para fazer disso um ato político. Porque sim, precisamos falar sobre prevenção. Se os aparelhos ideológicos de estado (mídia, escolas, família, associações de bairros etc.) não levam a educação perpetuando a estigmatização decorrente da ignorância, cabe à nós promovermos a divulgação da informação.

"Ain, Guto, você fica falando assim e vão pensar que você tem HIV."

Meu grande "foda-se" para o que pensam. Já pensaram até que eu era de direita porque eu sou branco e advogado. Isso, sim, é ofensivo! Não tenho medo de ir pra cama com uma pessoa com HIV. Meu medo é ir pra cama e descobrir que o sujeito é fascista.

O sistema vigente é LGBTIfóbico

Amiguinhe LGBTQIA+, o sistema vigente não te quer senão para consumir e ser mão de obra barata. Pare de se esforçar tanto para integrar esse sistema fingindo que sua existência não é em si mesma uma afronta a tudo que está posto. É preciso romper com a heteronormatividade e levantar nossas pautas a partir da nossa realidade e não da que a heteronorma quer nos atribuir. Tamo junte!
 
"Guto, não entendi nada, dá um exemplo do que você quis dizer para ver se fica mais claro."

1. Casamento monogâmico não foi inventado para você, gay. Para que se esforçar tanto para construir um padrão de vida que te exclui na sua gênese, em vez de usar sua energia para subverter essa norma?

2. Masculinidade — seja lá o que isso significa — como um valor socialmente estabelecido, já te exclui por sua própria definição. Então, force um pouco menos sua masculinidade porque você não será mais desejado por isso, por uma sociedade pautada na exclusão de quem você é. Pra ficarmos em apenas dois exemplos.

3. "Tudo bem ser gay, mas precisa dar pinta?" Em vez de responder que precisa, devolvo o questionamento. Por que não? Quando negamos a possibilidade de uma pessoa expressar sua existência na forma que lhe convém, estamos reconhecendo uma forma padrão de ser, que não engloba todos os corpos e suas diversidades. Isso é a cultura hegemônica, a mesma que exclui corpos LGBTQIA+ que se encontram privados da capacidade de consumir. É puro idealismo dizer que "o correto é". O que é o que a materialidade nos mostra. E a materialidade nos mostra que pessoas pintosas existem. Tentar encaixá-las numa caixinha de masculinidade é violência por negar o que elas são e ponto final.

Ao forçar trejeitos "adequados", engrossando a voz para parecer másculo ou travando as mãos para "não desmunhecar", o gay está tentando ser assimilado, ou seja, tentando integrar-se a um sistema vigente de pensamentos, comportamentos e crenças. Isso parte de uma valoração de um conjunto de ideias e formas, impostos pelas classes dominantes na sociedade, que são tidos como "a forma correta de ser". Se você sabe que sua existência não é um erro, então não é você quem deve negar a si mesmo para se assimilar. É o sistema quem precisa ser destruído para que seja criado um outro que lhe caiba.

segunda-feira, 12 de junho de 2023

Aquela dose de amor próprio

Se você já entendeu que você é a soma de todas as experiências que teve, e se essas experiências conferem o conhecimento que você tem em cada momento da sua vida, por que diabos você ainda se pune pela escolha errada que você fez no seu passado? Se você era tudo que tinha vivido até aquele momento, você tinha como fazer diferente do que fez? Você tinha a experiência que tem hoje para saber que naquele momento você não deveria agir como agiu? Então se perdoa, criatura!

O tamanho do seu amor próprio é inversamente proporcional à percepção do quão fodido é o sistema dentro do qual você se insere. Se você não consegue se amar e se perdoar pelas merdas que fez é porque não compreendeu com a clareza necessária que o sistema que te moldou é uma desgraça odiosa! Para que não fique dúvida: não sou um fofinho que pinta um mundo cor de rosa e vocês sabem disso. E menos ainda significa que eu irradie felicidade, não estou nem perto disso. A bem da verdade não acho nem que eu seja feliz. Mas, aí não é por falta de autoestima. Se tem uma coisa que eu sei é que eu sou foda pra caralho, e me orgulho de ser quem sou. O que eu odeio é o mundo. A mim mesmo eu só amo.

Alimente seu ódio. Ame-se imensamente mas odeie o sistema dentro do qual você está. Ame-se tanto, a ponto de acreditar que merece um sistema diferente deste que te ensinou a odiar a si próprio/a/e, apenas para te fazer comprar e trabalhar, vivendo para pagar contas para viver para pagar. Odeie o capitalismo.