sábado, 23 de setembro de 2023

Drogas: Quanto Custa Proibir

Acabei de assistir ao evento "Drogas: Quanto Custa Proibir", promovido pelo CESeC - Centro de Estudo de Segurança e Cidadania, em que participaram da primeira mesa de debates, além da coordenadora do CESeC, a socióloga Julita Lemgruber, também as coordenadoras de pesquisa Mariana Siracusa e Rachel Machado. Da segunda mesa, ainda com a presença de Julita Lemgruber, com mediação do influenciador digital Raull Santiago, participaram a deputada estadual Renata Souza e o neurocientista Sidarta Ribeiro. Na plateia, algumas lideranças políticas registradas, como as vereadoras Monica Cunha e Monica Benicio e a deputada federal Jandira Feghali.

Na primeira mesa foram apresentados os dados levantados pela pesquisa que dá nome ao evento, sendo apontados alguns números referentes aos custos sociais, econômicos e políticos que a famigerada "guerra às drogas" impõe à sociedade. Somente os estados de São Paulo e Rio de Janeiro juntos, para manterem as políticas oriundas da Lei nº 11.343/2006, que instituiu o Sisnad - Sistema Nacional de Políticas Públicas Sobre Drogas, são gastos anualmente R$ 5,2 bilhões. 74% das escolas do Rio de Janeiro foram afetadas pelos tiroteios resultados de operações policiais, sendo registradas uma perda aproximada de 64% do aprendizado esperado para português e quase 100% de perda no aprendizado de matemática, dentre alunos do 5º ano do ensino fundamental. No eixo da saúde 59,5% das pessoas relatam fechamento de postos de saúde, impedindo a população de acessar adequadamente o serviço.

Ao final da primeira rodada, na intervenção cultural que contou com a participação de MC Martina e Slam Laje, do Complexo do Alemão, foram recitados dois poemas, após os quais, deu-se início à segunda mesa de debates. O neurocientista Sidarta Ribeiro expôs a dificuldade de pesquisadores dos últimos trinta anos conseguirem levarem a cabo suas pesquisas com maconha para uso medicinal, em razão do pânico moral que sempre rondou o tema, e que sempre apresentou obstáculos à aquisição das substâncias envolvidas na pesquisa. Na sequência, enfatizou como o estigma sobre o tema, apontando-o como um instrumento dos conservadores, para perpetuação da guerra às drogas: "Para existir gente matável, é preciso haver estigma: traficante".

A deputada estadual Renata Souza, ao apontar as dificuldades dentro da sua atuação na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, correlacionou os prejuízos mencionados pela pesquisa apresentada na primeira mesa ao acúmulo de dinheiro por quem está do outro lado. Assim, levantou o questionamento: quanto lucra a indústria armamentista? Disse que o Estado se mantém, alimentado pela guerra às drogas. Diante dessa constatação, denunciou o silêncio conivente da ALERJ depois da chacina da Penha. Conclamou a necessidade de pautarmos os debates sobre as políticas de drogas, bem como sobre o desarmamento, apontando que não se faz esse debate nas esferas estadual e federal.

Quando foram abertas as falas e questionamentos dos presentes na plateia, pegando carona na fala da deputada Renata acerca do silêncio conivente da ALERJ e do Congresso, aproveitei o momento para fazer um questionamento, que veio na esteira de debates que historiador e comunicador digital Jones Manoelvem trazendo frequentemente em seus canais de conteúdo político: Em abril deste ano, o governo Lula alterou, a partir do Decreto nº 11.948/2023, o Decreto nº 8.874/2016, que regulamenta o PPI - Programa de Parcerias de Investimentos, para incluir em seu artigo 2º a possibilidade do BNDES financiar, através de PPP - parceria público-privada, a implantação, ampliação, manutenção, recuperação, adequação ou modernização do sistema prisional, o que se traduz na prática como privatização de presídios. Diante disto, perguntei para a deputada Renata sobre como os partidos de esquerda, que são a base do governo, têm lidado com a medida nas respectivas casas legislativas, já que se trata de um governo supostamente progressista adotando uma medida de estímulo ao encarceramento em massa, através da lucratividade à iniciativa privada. Mencionei o exemplo do Complexo Prisional de Erechim, no Rio Grande do Sul, que já conta com o financiamento do BNDES em parceria com a iniciativa privada.

Sem exatamente responder à questão, a deputada fez coro à necessidade de denunciar o descalabro que essa medida representa. Da plateia, a deputada federal Jandira Feghali pediu a palavra, dado que atua na esfera federal e, em vista disso, tem mais propriedade para falar sobre questões que envolvam o governo federal. Assim, a deputada respondeu que, pessoalmente, o presidente Lula não seria favorável à implantação da possibilidade de privatização de presídio e sugeriu que a inserção do dispositivo no artigo 2º teria sido um "descuido" que a assessoria presidencial teria deixado passar. Então, diante do público, comprometeu-se a levar a questão para o Ministro Flávio Dino para tentar suscitar o debate na esfera federal, a fim de tentar retirar do decreto a possibilidade de uma parceria público-privada que acarretasse a privatização de presídio. Cá pra nós, bastante problemática e insatisfatória, uma resposta que põe uma questão tão séria como um escorregão de uma equipe amadora em alguém com a história política do Lula.

Registro feito, é hora da sociedade pautar o debate para a imediata revogação desse dispositivo que abre a possibilidade da iniciativa privada ser responsável pela administração de presídios no país.

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