sexta-feira, 25 de novembro de 2022

Lula não é de esquerda

LULA NÃO É DE ESQUERDA E PRECISAMOS SEMPRE FALAR SOBRE ISSO

Tem gente que parece que ainda não entendeu: Lula não fará um governo de esquerda. Nunca fez, na verdade, embora tenha tido alguma contribuição para incluir o pobre na sociedade através do consumo. Tô nem entrando no mérito de que as políticas adotadas por Lula permitiram o crescimento de grandes conglomerados econômicos e, consequentemente, o sucateamento do estado e a mercantilização de direitos, como saúde e educação. Foca no pobre que pôde comer picanha e cerveja.

Ainda para esse público que foi beneficiado nos dois governos, o próximo mandato de Lula não será igual. O próprio presidente já declarou que seu governo será de frente ampla – não à toa seu vice é o ladrão de merenda Alckmin – e sabemos que frente ampla no Brasil significa abrir a porteira para pautas neoliberais passarem. Já vemos a mídia batendo no Lula antes mesmo dele tomar posse, por declarações mínimas como a de que o pobre precisa comer. O mercado, tadinho, ficou melindrado. Sensível demais esse tal mercado. A imprensa burguesa se refestelando em cima das falácias do rombo no caixa e da responsabilidade fiscal. Vai piorar em 2023.

Veremos um Lula amarrado pelas exigências do grande empresariado, que não quer direitos para pobre. Veremos uma imprensa vendida, cúmplice desse empresariado, pressionando o governo a cada eventual tentativa de furar o teto de gastos para garantir ao pobre o direito a três refeições por dia, à saúde e à educação. Veremos um governo sujeitado a essa pressão midiática, de cabeça baixa para os mandos do tal mercado, que é quem governa de fato. O resultado dessa miscelânea? Um Lula à direita fazendo um governo de austeridade.

É preciso deixar sempre, sempre muito evidente no nosso discurso qual a posição do presidente eleito no espectro político entre esquerda e direita: Lula vem aí mais à direita do que nunca. E por que precisamos lembrar disso? Porque daqui a alguns anos, talvez meses, enquanto estaremos vivendo no aperto oriundo da junção da terra arrasada deixada por Bolsonaro com a manutenção do teto de gastos e consequentemente com a falta de investimentos públicos em direitos sociais, veremos a imprensa lixo bater na tecla de que "a esquerda no poder" deixou o Brasil em maus lençóis. Mas, não haverá uma esquerda no poder! A demonização da esquerda será um combustível forte para a ascensão da extrema direita, que segue organizada e à espreita para o próximo bote.

A esquerda precisa dizer o seu nome e se afastar da imagem do Lula, fazendo oposição a todas as medidas que ele vier tomar para que sirvam de afago na cabeça desse mercado chorão que não quer dar ao pobre nem cerveja nem picanha.

terça-feira, 15 de novembro de 2022

Somos oito bilhões

Chegamos a OITO BILHÕES de habitantes no mundo. Com a exploração capitalista que insiste em transformar a natureza na mercadoria Natureza®, o planeta não suportará a quantidade de habitantes. Quando se levanta a questão, dez entre dez idiotas reacionários eugenistas de extrema direita (sim, é redundante, eu sei) dizem que basta o pobre parar de fazer filho para o planeta suportar. Claro, esse idiota reacionário não é o burguês. É o reacinha classe média que disputa vaga na universidade e não passa por ser incompetente, mas jura que a culpa é do preto pobre cotista. É o profissional medíocre que perde a vaga para a mão-de-obra qualificada do cubano e jura que a culpa é desse negócio aí de receber refugiado, em vez de fechar as fronteiras para esse povinho que vem roubar nossas vagas de trabalho. É classe média. É a porra do fudido assalariado de classe média, que foi criado por uma mãe solo sem saber o quanto ela ralou para permitir que ele estudasse e se formasse. E ele jura que basta o pobre parar de nascer para que o planeta dê conta de tudo. Ele não é burguês e jura que o Brasil está tomado por comunistas. Para ele, basta o pobre parar de fazer filho. Se tivesse estudado o mínimo, saberia que o mercado precisa do filho do pobre nascendo a todo instante para garantir que a mercadoria Filho-de-Pobre® continue existindo e sendo vendida a preço de uma corrida de ifFood para continuar sendo a mão de obra barata que produz a riqueza para o burguês acumular enquanto continua explorando o planeta, até torná-lo insustentável para oito bilhões de habitantes.

sexta-feira, 11 de novembro de 2022

O terrorismo do grande capital

A URSS foi desmontada em 1991. Era a maior e mais antiga experiência socialista do mundo e fazia frente ao imperialismo estadunidense, travando com os EUA uma guerra ideológica que dividiu o mundo em dois, a Guerra Fria. De um lado a propaganda capitalista e anticomunista a serviço da burguesia, tentando sufocar as experiências socialistas no mundo, promovendo boicote ideológico para impedir seu avanço e a consequente destruição da burguesia enquanto classe dominante. Do outro lado, estados organizados pela classe trabalhadora resistindo à dominação burguesa e avançando sua zona de influência para tornar internacional a experiência socialista.

A URSS negociava e financiava outros estados socialistas, sendo a maior parceira comercial de países como Cuba e República Popular Democrática da Coreia, vulgarmente conhecida no ocidente como Coreia do Norte. Quando a União Soviética foi desmontada em 1991, a Coreia do Norte perdeu sua maior fonte de financiamento. Localizada em uma área rochosa e montanhosa no extremo leste asiático, a RPDC não possui grande área agricultável, enfrentando dificuldades para produzir alimentos para a própria população. Nos anos de 1995 e 1996, a RPDC sofreu violentas inundações que destruíram as poucas lavouras existentes. No ano seguinte uma grande seca jogou uma pá de cal nas possibilidades norte-coreanas de produzir sua comida.

Durante este período de grande fome na RPDC, os Estados Unidos bloquearam o acesso a combustíveis naquele país, parando mais de 70% de suas fábricas, impossibilitando-a de produzir qualquer coisa. A Coreia do Norte amargou um período de grande fome, conhecido como Árdua Marcha. Pessoas que nasceram no começo dos anos 90 e só conheceram a escassez de alimentos facilmente se tornaram detratores de um forma de organização sociopolítica sabotada pelos EUA. Mencione-se ainda que, durante este período, a RPDC tentou obter ajuda internacional solicitando financiamento ao FMI, o que foi recusado pelos EUA, que é quem manda de fato na instituição.

Fiquem então com este resumo: durante uma fase de escassez de alimentos para toda a Coreia, os EUA lhe impuseram ainda mais dificuldades, com o objetivo de asfixiar um regime enquanto promovia o assassinato de uma população inteira pela fome. Hoje, toda vez que alguém lhe disser que as experiências socialistas registram fomes e dificuldades financeiras para suas populações, lembrem-se da Árdua Marcha e de como o capitalismo e toda a hipocrisia estadunidense com sua propaganda sobre liberdade matam populações inteiras.

Eu não sei você, mas quando uma força política impõe sofrimento para uma parcela de uma população com o objetivo de coagir outras forças políticas a adotar em determinadas medidas, eu chamo de terrorismo. E quando um país terrorista como os Estados Unidos se postam como salvador do mundo por combater o terrorismo, eu chamo de hipocrisia. Isso é o liberalismo. Isso é o capitalismo. Ainda não se convenceu de que os Estados Unidos fazem terrorismo com o resto do mundo? Como você chama um ataque a bomba para fins políticos? E quem foi mesmo que soltou uma bomba atômica em Hiroshima e outra, três dias depois, em Nagasaki, em agosto de 1945? Por hoje é só isso mesmo que eu tenho a dizer.

terça-feira, 8 de novembro de 2022

O ser e o dever ser

O SER E O DEVER SER

Voltando do Centro para casa num ônibus velho, sujo e caindo aos pedaços. Na porta um adesivo onde se lia "Para sua segurança este veículo só se movimenta com as portas fechadas". O veículo estava andando. A porta onde estava o adesivo estava aberta. Lembrei que só nesta semana no Rio, duas pessoas caíram de dois ônibus em movimento, que trafegavam de portas abertas. Provavelmente ambos tinham o mesmo adesivo.

Quando o Léo Aprígio pediu para eu tomar cuidado, eu respondi: "Não tem perigo, o ônibus não se movimenta se as portas estiverem abertas". Óbvio, era zoação. O ônibus estava se movimentando e sequer estava em baixa velocidade. "Não está vendo a placa?" Prossegui, apontando para o adesivo. As portas escancaradas.

Era evidente a distância entre a frase no adesivo e a materialidade do fato. O fato era que o ônibus estava andando. Não importa o que diz a norma no adesivo, nenhuma pessoa sensata contestaria o fato de que o ônibus estava andando e que aquele adesivo era um engodo. Alguém atestaria a validade de uma norma abstrata contida num adesivo, diante da realidade material que inequivocadamente a invalida?

Assim é com a legislação no estado burguês. A Constituição Federal diz em seu artigo 5º que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade".

Diante disto, ficam os questionamentos: somos, de fato, todos iguais? Temos todos as mesmas oportunidades de condições, os mesmos direitos e as mesmas obrigações? Ou será que somos o ônibus de portas abertas correndo pela Avenida Presidente Vargas desdenhando da norma que insiste em dizer que estamos parados?

Obviamente o ônibus estava andando. O adesivo estava equivocado. Deveria estar escrito: "Este ônibus anda, sim, de portas abertas, mas não deveria". Da mesma forma que não somos iguais perante a lei, mas deveríamos ser.

E mesmo com isso, insistimos em fingir que a norma - essa mera abstração - tem primazia sobre a materialidade. Na minha zoação, fechei os olhos à realidade ao dizer que o ônibus não andava de portas abertas porque o adesivo nele colado assim dizia. Vejam bem, eu não disse que ele "não andaria" e sim que ele "não andava".

Assim também fechamos diariamente os olhos quando fingimos que a norma geral a abstrata no Estado burguês tem primazia sobre a realidade material. A materialidade escancara diante dos nossos olhos a inconsistência da lei quando nos mostra que não há democracia nisto que chamamos de Estado Democrático de Direito. E assim, por acreditarmos na mentira da norma, despencamos na pista a cada curva que o ônibus faz enquanto corre veloz chacoalhando suas portas abertas.

sexta-feira, 4 de novembro de 2022

Redes sociais e geladeiras vazias

Quer pensar numa consequência grave de ser induzido a achar bonito postar nas redes sociais só os momentos de ostentação, felicidade e luxo?

Imagina que doido seria se em vez de usar as redes para ostentar a viagem para Iguabinha que pagamos em 18x no cartão, usássemos para mostrar nossas geladeiras vazias e pedir ajuda financeira?

Tá doido, Guto?! Imagina se vamos querer passar essa vergonha! É ninguém quer expor esse constrangimento. Além disso, de que adianta? Ninguém vai ter para ajudar, tá todo mundo na merda

Pois é... tá todo mundo na merda. E todo mundo sabe disso. Mas, todo mundo finge que não tá. E todo mundo segue plantando inveja em todo mundo. As férias no Morro de São Paulo, a balada na noite paulistana, os mimos que compramos da Apple... Os boletos para bancar tudo isso, só a gente sabe quantos miojos a gente precisa comer para dar conta de pagar. Todo mundo na merda. Todo mundo sabe. Todo mundo finge.

Mostrar nossa pobreza nos envergonha e, talvez por isso mesmo, nos desune. Eu não posto foto da minha geladeira vazia e da minha despensa empoeirada. Meu amigo também não. Minha mãe também não. Meu irmão também não. Minha namorada também não. Meu esposo também não. Minha colega de escritório também não. Meu crush do Tinder também não. Minha prima, meu vizinho, meus amigos de longe, ninguém.

E sem deixar conhecer nossas agruras financeiras, deixamos de conhecer quem mais, além de nós, precisa de ajuda. Já pensou que louco seria? Postar print do saldo bancário negativo e ver que está todo mundo na mesma situação? E constatar que, se está todo mundo na mesma situação, é porque há um sistema que precisa ser mudado? Pois é. Talvez todo mundo se unisse. Talvez não também.

A gente prefere postar foto do prato caro e do drink que brilha no escuro. E segue perdendo o sono à noite enquanto pensa no parcelamento a perder de vista da fatura do cartão de crédito que a gente não quer que os outros descubram. Mas, no dia seguinte estamos todos postando que precisamos de mais café, mais Rivotril. E logo depois mais uma foto do pôr do sol naquela praia do nordeste. A geladeira segue vazia.

O Cansaço da Coerência

Ser coerente cansa e eu estou de saco cheio de tentar me manter coerente o tempo todo. É exaustivo. Já xinguei mulher fascista. Já xinguei gay fascista. Já xinguei negro fascista. E já quis surrar cada uma dessas pessoas. "Ain, Guto, você não se envergonha de querer bater numa minoria oprimida só porque ela é fascista?" Sinceramente, não. E tento nem pensar muito a respeito.

Quem me cobra coerência é sempre quem não dá o exemplo. É sempre aquele homem hétero que passou a vida toda fazendo bullying com a gay afeminada na escola quem me questiona se eu não fico "constrangido por adorar Che Guevara, mesmo ele sendo homofóbico". Como se eu adorasse Che Guevara. Como se a patologização da homossexualidade não tivesse sido invenção da ciência produzida pelo capitalismo.

Vi um vídeo de um idoso cadeirante, vestido de verde e amarelo, em manifestação pró-golpe de estado, numa cadeira de rodas motorizada, tentando atropelar um grupo de pessoas resistentes. Se fosse comigo, eu teria chutado a cadeira de rodas de lado para fazê-la tombar e ele bater a cabeça no chão. É capacitismo valer-me da deficiência física de alguém para atacá-lo? É. Mas, não fui eu quem mandou paraplégicos para câmara de gás. Menos ainda sou eu o paraplégico que defende esse tipo de medida e atropela quem milita por políticas que respeitem direitos humanos.

Sinceramente, tô pouco me fodendo se eu tiver de levantar a voz para uma mulher supremacista branca. Essa gente não merece minha coerência e eu estou farto por diariamente me exercitar para eliminar minhas contradições. E vejam bem, não estou falando aqui de "mulher que vota em Bolsonaro". Estou falando da que vota por alinhamento com seu discurso de ódio. Há sempre aquelas pessoas que foram enganadas, que acreditam nas fake news que o pitam como um cara do bem. E não me refiro a essas. Com essas eu compartilho informações, dialogo e oriento. Refiro-me àquelas que realmente se identificam com políticas de extermínio. Essas só recebem de mim o meu ódio.

Para fascista não me sinto na obrigação de dar o meu melhor. Como eles mesmos dizem, essa conversa de racismo, misoginia, homofobia, capacitismo, xenofobia... Isso é tudo mimimi que segrega mais do que une quando se tratam de nazifascista. Não vejo cores de pele, vejo racistas. E odeio a todos da mesma forma. Não vejo orientação sexual e gênero. Não discrimino. Odeio igual. E acho que devemos eliminar todos igualmente.

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

Cai no golpe quem quer

A gente continua rindo deles. Olha como são toscos, kkk, a Cássia Kis de joelho na chuva, kkk. E esse pessoal aqui, que foi para a porta do exército de BH cantar Geraldo Vandré? Kkk, como são burros! Aceita que dói menos, bolsominion, kkk. Vai pro Afeganistão, kkk. Você viu o cara se jogar em cima do carro? Que vergonha alheia, kkk. Entrei no grupo deles pra zoar, pede choro impresso agora, gado, kkk...

E assim, vamos subestimando. A gente ri deles, a visibilidade deles cresce. A gente ri da burrice deles. Eles continuam crescendo enquanto rimos. Eles invadem ruas enquanto rimos. Eles tentam um golpe de estado enquanto rimos. E enquanto rimos, eles tomam para o si o poder do povo. Depois que nosso riso for asfixiado não vai adiantar chorar.

Isso tudo me lembra "A Lebre e a Tartaruga", aquela historinha infantil da corrida entre os dois animais. Todo mundo ria da tartaruga que, a passos lentos, ficava para trás, quando a lebre decidiu tirar uma soneca. Perdeu a hora, a tartaruga a ultrapassou e ganhou. Depois de ter sido subestimada.

Isso me lembra também o filme "Ele está de volta", no qual Hitler ressuscita no mesmo lugar onde era seu bunker, 70 anos depois do fim da guerra. Pensando que se trata de um ator de comédia fazendo paródia do Hitler real, as pessoas riem dele. E na troça, cedem-lhe espaço na mídia. Ele cresce. Na graça podem-lhe autógrafo. Pedem fotos com ele. Ele cresce. Torna-se popular. Daí em diante é spoiler. Assistam.

Aqui a gente também ri. E de riso em riso, alguém mais veste uma camisa da seleção brasileira e integra a horda, fazendo-a crescer. O golpe está acontecendo e não lhes damos credibilidade. Taí. Cai quem quer.

E pelo que vejo, parece que queremos muito.

quarta-feira, 2 de novembro de 2022

A forma versus a matéria

Direito à manifestação é legítimo. Inclusive, tenho andado bem irritado com essas postagens Paz-&-Amor® que mostram "nós" em 2018 com figurinha ninguém-solta-a-mão-de-ninguém®, e eles em 2022 com estrada em chamas. Se tivéssemos parado este país quando um genocida foi catapultado ao Planalto, talvez hoje não tivéssemos que suportar o luto por 700.000 vidas ceifadas numa pandemia. E vamos combinar que essa figurinha é mentirosa pra caralho e no fim, todo mundo soltou a mão de todo mundo, do jeitinho que o capitalismo quer.

Problema não é a forma, povo. É a matéria. Não é por haver manifestação, mas pelo que eles manifestam. Nós também nos manifestamos. A diferença é que enquanto nos manifestamos por políticas de transferência de renda e redistribuição de riquezas, eles se manifestam pela manutenção à acumulação de capital e à perpetuação das desigualdades sociais. Enquanto nós nos manifestamos pelo povo oprimido, eles se manifestam para a burguesia que oprime.

Quando nos limitamos a atacar a forma com a qual o outro age, deslegitimamos nossas manifestações se usarmos as mesmas formas. E cá para nós, deveríamos aprender com essa gentalha, que agora está tomando o Centro do Rio debaixo de chuva, no frio, ajoelhando em xixi de ratazana e atrapalhando o trânsito em pleno feriado. Se fizéssemos algo do tipo quando nos retiram direitos, faríamos um barulho...

Precisamos atacar aquilo que embasa as manifestações desses que pedem o golpe militar enquanto o Estado se acovarda. Eles pedem a continuidade do fascismo. E o fascismo, por ser um movimento de massas, se regozija com a facilidade com a qual a massa o chama nas estradas bloqueadas.

E nós ficaremos olhando, estupefatos, pelas telas dos nossos celulares, esse show de horrores protagonizado por essa gente vestida de amarelo e verde, sem os confrontarmos, enquanto eles continuam matando pessoas por falta de tratamento, por falta de oxigênio, ou de fome causada pelo aumento dos preços decorrente do desabastecimento? Enquanto eles fazem saudação nazista cantando hino nacional, olhamos orgulhosos da nossa passividade bovina de quem não virou o Brasil de cabeça para baixo quando um torturador foi homenageado. E ainda os chamamos de gado?!

terça-feira, 1 de novembro de 2022

Terceirizando responsabilidades. Como sempre.

TERCEIRIZANDO RESPONSABILIDADES. COMO SEMPRE.

O silêncio do presidente Bolsonaro pode ser tão nocivo quanto sua fala, o que se pode constatar no primeiro pronunciamento após o resultado das eleições. Em aproximadamente dois minutos, Bolsonaro não reconheceu o resultado das urnas e, como já está acostumado, terceirizou a responsabilidade pela tentativa de golpe que está em curso, capitaneado pela Polícia Rodoviária Federal em conluio com parcela do movimento de caminhoneiros.

Abrem-se aqui dois parênteses. Necessário mencionar que nem mesmo Chorão, presidente da Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotores (Abrava), líder da greve de 2018 e um dos principais líderes do movimento dos caminhoneiros, aderiu a esta paralisação, atribuindo-a à ala mais radical da extrema direta dentro. Ainda dentro destes parênteses, o deputado federal Nereu Crispim (PSD-RS), presidente da Frente Parlamentar Mista dos Caminhoneiros Autônomos, também ja criticou veementemente a paralisação da categoria, a quem chamou de baderneiros. Fecham-se os parênteses.

Pelo relatado, evidencia-se que o movimento golpista, que não aceita o resultado das urnas, organizou-se a partir de mobilização da sociedade civil. Sem apoio dos líderes, grupos reacionários dentro do movimento dos caminhoneiros se organizaram e partiram para uma ação tática. Bolsonaro, que se beneficia de corpo e alma dessa greve, não tentou acalmar os ânimos dos agitadores, não tentou desmobilizar a ação, não pediu a liberação das vias.

De forma um tanto oblíqua, sem querer comprometer-se com a própria fala (como se alguém esperasse por isso), Bolsonaro apenas se limitou a dizer que respeitassem o direito de ir e vir. Assim mesmo, de forma genérica, sem materializar o conceito num exemplo concreto, para não permitir ao ouvinte sequer imaginar qualquer cena em que coubesse a frase. Quem cala consente, o atual mandatário do país com seu silêncio, deu apoio ao movimento golpista que toma as estradas e promove desabastecimento de prateleiras. Seu silêncio é motor para que seus apoiadores tomem as ruas, fechem mais estradas.

Enquanto vemos parte da extrema direita se organizando sem determinação de um "líder supremo", inevitável o questionamento sobre o que os partidos de esquerda com representação no Estado pretendem fazer diante da crise instaurada pelo golpe em andamento. Se o silêncio de Bolsonaro é combustível para os golpistas, o silêncio de Lula possui o mesmo efeito.

A Polícia Federal Rodoviária aparelhada por Bolsonaro está descumprindo ordem do Judiciário, o que denota a fraqueza do Estado Democrático de Direitos diante do Estado Armado. E os 60 milhões de eleitores do Lula, alguém já convocou? Lula, o conciliador (e isso nunca será um elogio neste contexto), já deveria ter chamado seus apoiadores há tempos para que tomassem as ruas. Não para desfazer barricadas, já que pessoas sensatas não devem se aproximar desses desordeiros de extrema direita, armados e municiados de ódio. Mas, para mandar no Estado. Reza a lenda que, neste Estado, o poder emana do seu povo. Sabemos, Lula não o fará.

Mais uma vez, nós, de esquerda radical, vemos a extrema direita se apropriar do discurso e da estratégia que eram para ser as nossas. Vivemos o pesadelo de um cenário político tão caótico e extremado, que nos empurra goela abaixo a obrigação de defender instituições burguesas, estas mesmas que agora se mostram fracas. Esperamos líderes que se quedam silentes e aguardamos. Depositamos nossa agência na mão de representantes que não nos representam e cruzamos os braços, delegando nossa obrigação enquanto sociedade civil organizada.

Enquanto isso, Bolsonaro se esquiva. Faz até mais sentido pensar que para os dois minutos de discurso, o presidente necessitasse de 44 horas para elaboração, a fim de medir as palavras de forma que menos lhe comprometam. Sem condenar a greve, Bolsonaro a incentiva. Sem reconhecer os resultados das urnas, ele estica a corda mais uma vez para deixar ver até onde vai a insurreição. Se ganhar adesão e tomar proporções com poder de mudança de cenário, ele leva vantagem. Sem dizer expressamente que Lula é presidente, poderá alegar que nunca reconheceu o resultado e que povo e as Forças Armadas estão ao seu lado. Golpe instaurado. Fim. Se enfraquecer, ele se pronuncia: “Não fui eu, foram vocês. Parem. Não pode fechar estrada, talkey?” E voltam os caminhoneiros rebeldes todos para casa, quietinhos, com dedo de Bolsonaro apontado para a cara, enquanto são abandonados à própria sorte. Bolsonaro é escorregadio. É como costumam ser os vermes que nos parasitam.